O tenente da Polícia Militar da Bahia Danillo Ferreira publicou no seu blog Abordagem Policial, uma das maiores referências na área de segurança pública no Brasil, no dia 14 de junho de 2013, ápice das manifestações nas mídias sociais e nas ruas do país inteiro, uma carta de um policial militar, escrita e enviada por um leitor anônimo, que descrevia o conflito ético e moral vivido pelo autor durante os protestos ocorridos em São Paulo. O post gerou uma repercussão enorme na internet, principalmente no Facebook. Danillo deu entrevistas na grande imprensa nacional e também respondeu às perguntas do Digaí sobre os movimentos populares que mexeram com o país durante a Copa das Confederações.

O blog Abordagem Policial, administrado pelo tenente da PM Danillo Ferreira, ganhou maior repercussão nacional durante as manifestações ocorridas em junho deste ano.
Abordagem Policial é uma das maiores referências na área de segurança pública

 

 

O tenente da PM baiana destaca o papel da internet na força da mobilizações atuais. “Estas manifestações evidenciam o que marca a geração atual: a peculiar capacidade de comunicação. Insatisfações sempre existiram em diversos momentos da história, muitas delas levando o povo às ruas. Mas agora a internet possibilitou a ausência de liderança formal – que antes centralizava os rumos do movimento – e um poder de viralização das causas”, analisa. Confira abaixo a entrevista completa:

 

 

Digaí – Como e quando surgiu o blog Abordagem Policial? E qual foi a motivação para criá-lo?

 

Danillo Ferreira – O Abordagem Policial surgiu em 2007, quando eu era aluno-a-oficial na Academia de Polícia Militar da Bahia. Eu e mais outros quatro colegas queríamos transferir as discussões que tínhamos nos corredores da Academia para um ambiente mais amplo, onde outros atores policiais e não policiais participassem. A internet surgiu como uma possibilidade, e criamos então o Abordagem Policial.

 

Digaí – Antes do blog, como era o seu contato com a Internet?

 

D.F. – Mexo com blogs desde 2004, quando criei meu primeiro blog na plataforma weblogger (do Terra), lembram? Nesta época não pensava em me tornar policial, nem em ter um site com muitas visualizações/relevância. Apenas comentava assuntos do cotidiano (política/comportamento), arte e cultura.

 

Digaí – Quando o seu blog publicou a “carta de um policial militar”, escrita anonimamente, você esperava que o post tomasse a repercussão que tomou? Você já tinha em mente que seria bastante compartilhada e comentada nas redes sociais?

 

D.F. – De forma alguma. Apesar da originalidade da carta, que traz a visão lúcida de um policial que atuou nos protestos, mas que se identificava com as causas, aquele parecia ser apenas mais um texto enviado por um leitor. Foi uma boa surpresa…

 

Digaí – Quantos visitantes o seu blog teve por dia por causa dessa carta?

 

D.F. – Em um dia, tivemos sessenta mil visitas.

 

Digaí – Agora, já quase um mês após início dos protestos, o seu blog continua tendo uma audiência alta? A curva está em crescimento, estabilizou ou diminuiu?

 

D.F. – Como é comum nesse tipo de repercussão, as visitas diminuíram em relação ao pico proporcionado pela carta. Mas comparativamente ao que o blog tinha como costume, crescemos bastante.

 

Digaí – Na sua opinião, por que essas manifestações ganharam força na internet, especialmente nas redes sociais? Como você enxerga esse modo de mobilização no Brasil?

 

D.F. – Estas manifestações evidenciam o que marca a geração atual: a peculiar capacidade de comunicação. Insatisfações sempre existiram em diversos momentos da história, muitas delas levando o povo às ruas. Mas agora a internet possibilitou a ausência de liderança formal – que antes centralizava os rumos do movimento – e um poder de viralização das causas. Vivemos um grande aprendizado quanto à forma de manifestação e protesto. A tendência é que este tipo de fato histórico ocorra cada vez mais, talvez em menores proporções, mas com as mesmas características de (des)organização.

 

Digaí – A todo momento, governantes e autoridades policiais buscavam lideranças em meio a um movimento que aparentemente não tinha uma organização centralizada. Também na sua opinião, o Estado e os comandos das polícias estão despreparados para este novo cenário?

 

D.F. – Sim. Todos foram pegos de calças curtas: nem mesmo os manifestantes sabiam que isso era possível e que ocorreria do modo que ocorreu, nas proporções que ocorreram. Havia uma insatisfação no ar, ou várias delas. De repente, ela foi canalizada por essa nova mídia descentralizada. O resultado vimos nas ruas. Quando o Estado tentou controlar com unanimidade de reprovação na mídia de massa, repressão e negociação com lideranças (velhas táticas), se achou encurralado.

 

Digaí – Se estão despreparados, como agir em protestos públicos como esses em que a um discurso horizontal? E como agir na internet?

 

D.F. – Para uma geração de comunicadores nada pode ser tão nefasto quanto não ter o direito de se manifestar. As polícias e o Estado precisam entender que a liberdade de expressão agora é regra. Não é mais possível controlar. A mídia de massa já não domina toda a informação que as pessoas têm contato. O que fazer? Garantir o direito de se manifestar e ouvir. A polícia agora deve proteger a livre expressão da população – qualquer que seja a causa. Se houver abuso e cometimento de crimes, que sejam reprimidos, lembrando que a própria polícia tem o dever de prevenir estrategicamente possíveis abusos ao direito de protestar.

 

Eaí? O Que você achou da entrevista? Concorda com Danillo Ferreira? No dia 26 de junho, publicamos um artigo que tratava exatamente dessa falta de liderança formal nas manifestações promovidas pela internet – “A busca dos políticos pela verticalização nas plataformas horizontais de redes sociais”.

 

 

Posts Relacionados