O mercado fonográfico foi um dos mais afetados pela popularização e evolução da internet nas últimas décadas. Com o surgimento do MP3 e de plataformas como o Napster (quem está na faixa dos 25/30 anos para frente sabe do que estou falando), Torrent, 4shared, o Orkut com suas comunidades e posteriormente o Facebook e inúmeros blogs espalhados pela rede, a compra de CDs diminuiu exponencialmente e o mercado começou a balançar.
Devido a praticidade e o aumento de equipamentos compatíveis com a nova tecnologia de áudio, o consumidor comum de música migrou rapidamente para uma nova realidade que substituía cases lotados de CDs, que muitas vezes eram danificados pelas caixinhas, por pendrives e MP3 players.
Com o lançamento do iPod pela Apple e o grande sucesso de vendas do novo “brinquedinho”, as mídias físicas pareciam ter cada vez mais os seus dias contados e todo o mercado fonográfico se perguntava o que viria pela frente, como se adaptar à tal cenário.
Gravadoras, promotores, artistas, rádios e demais integrantes desse grande e milionário segmento precisavam encontrar novas formas de angariar receitas e promover seus lançamentos.
A MTV já não possuía a mesma força de antes, graças a outro gigante que surgiu – o YouTube – e os shows tornaram-se a principal fonte de renda de bandas de todos os portes.
Era necessário se reinventar. Os artistas ampliaram suas turnês, buscaram novos mercados consumidores e novas formas de manter a agenda lotada.
Aqui no Brasil o efeito foi claro: bandas e cantores de diversos estilos e partes do mundo começaram a desembarcar em solo brasileiro com muito mais frequência e os artistas nacionais tiveram que investir de forma pesada em divulgação e gestão de suas marcas para continuarem relevantes nesse momento tão incerto.
Hoje constatamos a importância das plataformas digitais na categoria com o alto investimento em redes sociais, produção de vídeo clipes – agora para veiculação na internet – e outros conteúdos quem mantenham sempre o fã em contato direto com seu ídolo. O avanço tecnológico propiciou, também, uma grande revolução em como se grava um disco.
Se antes apenas os grandes artistas tinham acesso a estúdios e profissionais gabaritados para a produção de um álbum de qualidade, hoje cresce o número de CDs gravados em Home Studios e o dinheiro, cada vez mais escasso, começou a ser direcionado pelos artistas independentes para cuidar das suas mídias e promoção de seus trabalhos. No entanto, na esfera das grandes bandas, muito dinheiro ainda é gasto para a confecção e lançamento desses trabalhos e cada vez mais cresce a importância de uma estratégia de lançamento e promoção bem planejada, que garantirá o interesse do público que ainda compra música, seja pelos CDs ou pelas plataformas digitais como o iTunes, Spotify e Deezer (apenas para citar alguns), da imprensa e consequentemente dos promotores que irão contratar as turnês.
O marketing de expectativa torna-se um importante aliado para atrair a atenção do público e demais integrantes da indústria do entretenimento, e nesse post falarei de algumas estratégias que foram adotadas recentemente por grandes artistas e quais foram os resultados alcançados e as lições que podemos tirar de cada caso.
Um dos episódios mais comentados do ano com certeza foi a parceria entre o U2 e a Apple para o lançamento do novo álbum da banda irlandesa, Songs of Innocence. No dia 9 de setembro, a Apple disponibilizou o disco na íntegra no iTunes para todos os usuários da plataforma. A estratégia ousada e, para muitos, invasiva, trouxe opiniões distintas.
A “sacada genial” de Bono Vox, seus colegas e Tim Cook – CEO da Apple – agradou em cheio aos fãs da banda, que puderam conferir de graça e de surpresa as novas músicas do grupo, porém eles não imaginaram, aparentemente, como a tática iria soar para os demais usuários.
Pelos protestos que surgiram aos montes na rede, Bono fez um pedido formal de desculpas -“talvez a gente tenha se empolgado demais”.
Os números, no entanto, mostram que resultados positivos foram alcançados: segundo a Apple, 81 milhões de pessoas escutaram o disco no iTunes e 26 milhões fizeram o download do álbum na íntegra.
Em seu debut físico, Songs of Innocence estreou em nono lugar nos EUA, vendendo 28 mil cópias na semana de lançamento (fonte: Billboard). Comparado com outros desempenhos da banda pode parecer pouco, porém no cenário atual, tal exposição significa muito trabalho para a banda pelos próximos anos e o objetivo de atrair os olhos para a mais recente obra foi com certeza alcançado.
Outro case interessante foi o lançamento do novo trabalho da banda de Heavy Metal Slipknot. A banda de mascarados, liderada pelo vocalista Corey Taylor e pelo percussionista Shawn “Clown” Crahan, passou por um período bastante complicado nos últimos anos. Após perder um dos seus mais dedicados integrantes, o baixista Paul Gray, morto em maio de 2010, a banda demitiu um dos seus mais carismáticos e aclamados membros, o baterista Joey Jordison, deixando fãs e crítica preocupados com o futuro da banda.
Para muitos artistas, mudanças desse tipo são testes pesados para validar sua importância na indústria e o lançamento e desempenho do primeiro álbum da nova fase são representativos para vislumbrar um futuro promissor ou não.
Para o lançamento de .5: The Gray Chapter, a banda realizou mais um trabalho de marketing de qualidade (que já é uma marca da banda, conhecida por muitas pessoas que não são fãs de Heavy Metal, por sua apresentação visual e cuidado com tudo o que leva o nome Slipknot).
Lançado oficialmente em 17 de outubro, o marketing começou a trabalhar 3 meses antes, com a divulgação de teasers com cerca de 20 segundo que pouco revelavam, mas que fazia crescer a expectativa pelo retorno da banda.
Em 1 de agosto, após a veiculação de cinco desses teasers, o clipe da música “The Negative One” (do qual os trechos citados anteriormente eram extraídos) foi disponibilizada no YouTube e o vídeo conta com quase 8 milhões de visualizações, sucesso acompanhado por outras músicas lançadas de maneira prévia na mesma plataforma.
Com um planejamento que integrou a atualização constante do site oficial da banda para divulgar todos os conteúdos que eram lançados, a produção de vídeos que mostravam prévias da arte gráfica do novo trabalho e o bom uso do YouTube e de players como o Deezer e o Spotify para a divulgação do álbum, o lançamento foi um sucesso e .5: The Gray Chapter atingiu o primeiro lugar nas paradas americanas em sua semana de estréia – e encerra o ano dentro do Top 20 de Álbuns de Rock pela Billboard.
O primeiro single, The Devil in I, teve seu clipe lançado no YouTube e conta com quase 19 milhões de visualizações e 100 mil compartilhamentos em pouco mais de 2 meses.
O planejamento e a utilização das mídias digitais de forma contínua e cuidadosa garantiu à banda não apenas a confiança do público e da crítica sobre o que virá pela frente, mas também assegurou que os mascarados terão uma agenda lotada pelos próximos anos e a conta bancária continuará gorda.
Os exemplos apresentados mostram que planejar e executar com cuidado as práticas de marketing de expectativa nas mídias digitais podem ser uma boa saída para se destacar em mercados exigentes e que passam por momentos complicados, como a indústria fonográfica.
É necessário, no entanto, entender que a presença massiva do público na Internet e sua sede por novos conteúdos deve ser ponderada na formulação de estratégias que busquem comunicar mas mantendo o respeito pela privacidade do usuário e seu poder de escolha, evitando, assim, que “o tiro saia pela culatra” e que a marca acabe sendo prejudicada.
Para os artistas independentes ficam as lições de como um planejamento de marketing bem feito e aliado com as tendências tecnológicas podem ser cruciais para a divulgação de trabalhos sem os “pomposos” cheques assinados pelos executivos das gravadoras.
O mundo está cheio de fenômenos que nasceram através do YouTube e existe sim espaço para novos artistas e o público está querendo conhecê-los, para isso deve-se não apenas investir, mas planejar ações de marketing que busquem dialogar e surpreender o público-alvo, mostrando novos talentos surgem a todo momento, porém não basta apenas ter talento para tocar e cantar, é necessário conhecer o seu cliente e produzir conteúdo constante para estabelecer uma relação forte entre marca e consumidor.